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Dez07
As mãos.
Marco
O número sessenta e seis obrigava-me a uma espera paciente naquele banco disfarçado de hospital onde a tosse se ouvia em pano de fundo, colorido de olhares cheios de vazio, apenas esperando que o número o seu número em conversas da treta sobre vizinhos e conhecidos num diz que disse por mim ignorado, fechado que estava dentro das minhas músicas de sempre, incapaz que sou de me separar delas, fazem-me confusão conversas da treta e mais a mais sou do tipo tímido, deixem-me lá estar no meu canto, tudo o que quero é que logo o sessenta e seis para voltar rápido às minhas escritas.Sessenta e dois. Sapatos castanhos de atacadores marca Confort com sola de borracha, calças verdes escuro de bombazina, camisa branca, pulôver cinzento e casaco de fazenda também cinzento. Mãos nos bolsos e os documentos debaixo do braço esquerdo. Cabelo grisalho. Sessenta e três. A espera espera para todos e a impaciência já misturada no meio da tosse e do diz que disse. Até que as mãos. As mãos finalmente de fora e não umas mãos como todas as mãos, uma espécie de V feito de dois enormes dedos que seguravam a custo os documentos enquanto o sessenta e três perguntava mais uma vez aquilo que não queria perceber.
Naquela fracção de tempo, imaginei-lhe o porquê? Justifiquei-lhe os bolsos e perguntei-me se desde sempre, se algum acidente, se a guerra, se o destino, se a sorte. Olhei-o nos olhos e nada de respostas, apenas detalhes cada vez mais nítidos, uma grande aliança de casado, uma dificuldade em ser simplesmente normal que me deixou pregado ao chão, sessenta e quatro, já nada de tosse, nem de música, nem de nada, só porquês atrás de porquês até que sessenta e cinto, a vez dele, em direcção ao balcão e eu em direcção à porta porque duas da tarde e não sou cá pessoa de atrasos, hoje é outro dia e boa sorte para si, tenha cuidado com essas tosses todas, olhe que ainda lhe pegam.