27
Mar07
Quieto demais.
Marco
Sentada aqui neste sofá estranhamente grande, desconfortável de tão vazio, de tão preto, de tão frio, imagino-te todos os passos, conheço-te todos os passos, os movimentos que fazes e os que deixas de fazer, conheço-te as horas certas para existires, os sítios que ocupas contigo mesmo. Olhas-me nos olhos com um sorriso que também conheço muito bem, estás quieto demais nessa fotografia, apenas a sorrir indiferente às lágrimas que me escorrem cara abaixo.Fechada neste mundo de imagens que eu mesma crio vejo-te a chegar das compras cheio de legumes que nem precisamos mas que compraste a bom preço. Vejo-te a chegar de manhã vindo do trabalho, cansado, pronto para ires dormir todo o dia. Vejo-te a divagar entre a cozinha e o quintal, entretido com a tua vida. Fechada neste mundo de imagens que eu mesma crio, abro os olhos e vejo-te a olhares-me fixamente ao mesmo tempo que sorris. Quieto demais.
Encurralada nesta vida que não sei viver sem ti, sinto-me só. Sim, o telefone toca, a campainha também, mas faltas tu. Tenho saudades de te ouvir fazer barulho a remexer as moedas no bolso, parece que te estou a ver e estou mesmo, estás a olhar-me nos olhos ao mesmo tempo que sorris. Conheço-te tão bem esse sorriso. O som que fazias. A alegria com que o fazias. Pelo amor de Deus, mexe-te! Estás quieto demais nessa fotografia. Não vez as lágrimas que me escorrem cara abaixo?