08
Fev07
Ninguém deu por isso.
Marco
De onde vinha tal “fascínio” era algo a que ninguém conseguia responder com exactidão. Aliás, as pessoas nem sequer se detinham a pensar nisso. Davam-na como um dado adquirido e pronto, cada uma à sua maneira puxava a sua parte, exigindo, querendo, cobrando cada pedaço de si, como se propriedade sua. Tão somente sua. Não interessava a hora, não interessava o dia, não interessava quase nada. Apenas essa parte ou quem sabe o todo, já, agora!As noites, essas, eram longas. Pesadas. Eternas. Horas sucessivas em que o sono leve de evaporava dando lugar a uma insónia persistente, implacável, também ela a exigir a sua atenção sem sequer reparar no mal que lhe fazia. Até que por fim, de novo o sono leve em horas fugidias, cruéis na forma como lhe fugiam e claro, logo de seguida a manhã. Mais uma manhã de rotina, de puxões, aqui, ali, acolá, a toda a hora.
Nos seus olhos era visível um cansaço pesado, esmagador. Tão visível e no entanto tão despercebido às pessoas, focadas em si mesmas e nas suas exigências. Puxando apenas a sua parte, voltando a exigir, voltando a querer. O seu sorriso, que parecia ser inesgotável, foi-se fechando, devagar, devagar. A sua energia foi desaparecendo até que, numa noite de chuva envergonhada, o seu corpo cedeu. Sentou-se prostrada, baixou a cabeça e chorou.
Ninguém deu por isso.