Inventor.
Ao Gerson chamo-lhe o Inventor e chamo-lhe o Inventor não só pelo penteado de choque eléctrico mas porque do nada arranca coisas que passam a existir, coisas de verdade que por certo testa em noites de insónia, fechado no seu laboratório, escondido entre tubos de ensaio fumegantes, esperando numa paciência de Samurai a perfeição que sempre acaba por acontecer e nesse preciso instante, claro, os seus olhos castanhos cor de amêndoa, brilhantes, cristalinos, enormes, a sorrir, felizes por mais uma conquista, capazes de significar todas as palavras, todos os livros, o Gerson, imagino-o a correr em direcção ao seu bloco de notas, de caneta na orelha, para assentar o segredo da sua imensa alegria, fórmulas indecifráveis cheias de X's e Y's que depois resume numa simples ginga de cintura e num olhar carregado de verdade que só é possível admirar, não tanto invejar, mas admirar, o Inventor, sempre perdido em ruas de labirinto, sempre esquecido das horas, dos dias, até dos meses, preocupado que está em fazer contas a uma vida que teima em fintá-lo, sem sucesso, porque em tempo útil o Gerson percebeu o segredo das coisas simples, entendeu na perfeição o significado de um abraço sentido, descobriu o valor único dos corações limpos e soube, nesse momento, nessa fracção de segundo, que seria feliz, que nada poderia estragar a magia que carrega e que a nós, comuns mortais, vai emprestando em formato de gingas inesquecíveis em vez de nos maçar com incógnitas que, por mais que nos esforcemos, não vamos nunca conseguir entender.