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Deep Silent Complete

"Escrevo-me. Escrevo o que existo, onde sinto, todos os lugares onde sinto. E o que sinto é o que existo e o que sou. Escrevo-me nas palavras mais ridiculas...e nas palavras mais belas... Transformo-me todo em palavras." - José Luís Peixoto

Deep Silent Complete

"Escrevo-me. Escrevo o que existo, onde sinto, todos os lugares onde sinto. E o que sinto é o que existo e o que sou. Escrevo-me nas palavras mais ridiculas...e nas palavras mais belas... Transformo-me todo em palavras." - José Luís Peixoto

11
Jul07

Parabéns (atrasados) Ilda.

Marco
Há uma fotografia naquele álbum de pele castanha guardado numa mala algures esquecida que diz muito mais do que todas as palavras que significam amor no dicionário. Nesse pedaço de eternidade olhas-me com uma felicidade que não cabe em ti, nem sequer na fotografia e por isso aqui, na minha memória como se estivesse agora mesmo a observá-la. Quase aposto que esperaste toda a vida por aquele momento e caramba, se valeu a pena. Só pela fotografia, valeu a pena!

Sempre achei graça a uma coisa em ti. Podes estar a cair de dores, destruída por dentro, feita em mil pedaços impossíveis de refazer e no entanto, basta veres-me para te mascarares de sorriso e me dizeres prontamente que está tudo bem, como se a vida toda ela perfeita tal e qual o pedaço de tempo parado da tal fotografia. É como se tivesses um esconderijo secreto onde armazenas o teu último bocadinho de força, que despejas cá para fora mal me avistas por perto.

Na passada sexta feira fizeste anos e ao contrário do que fiz para o resto da família, não te dediquei um texto nesse dia. Não porque me tenha esquecido, mas havia decisões para tomar, reuniões para ter, um futuro para decidir e por isso só agora, cinco dias depois. Só gostava de ter talento para escrever em palavras o que sinto por ti, mas sempre te digo que se isso pudesse ser fotografado, essa imagem diria por certo, muito mais do que todas as palavras que significam amor no dicionário.
10
Jul07

A dor do nada.

Marco
Não sei se me mata
esta dor que me dói
parecendo que mata
enquanto dói,
feita dor, que mata.

Sei que me aperta
esta dor que me dói
parecendo que fura
enquanto dói,
feita dor, que aperta.

Não sei  se é tempo
este tempo cheio de nada
parecendo tempo
enquanto nada,
feito tempo, que nada.

Sei que me dói
este nada cheio de tempo
parecendo que passa
enquanto não passa,
feito nada, que tempo.
06
Jul07

Hoje ao almoço.

Marco
A pele vincada dava-lhe um ar vivido, como se anos de vida tivessem desenhado aqueles riscos, qual projecto de arquitectura. O cabeço branco acrescentava-lhe uma credibilidade da qual nem ousei desconfiar. Sentado numa frágil cadeira branca de plástico, observei aquele rascunho vivo mover-se sem destino, com o relógio quase a cair-lhe do pulso. O calor derretia-me em água e pensei: será este o tal Verão de que todos falam, o tal que segundo parece, este ano nem vê-lo?

A moeda que me pediu a troco de uma melodia já quase defunta não chegou a sair-me do bolso. Preferiu ficar-se por casa, em cima daquela estante onde serve para coisa nenhuma, apenas uma chapinha ridícula, ladeada por uma televisão desligada e uns quantos discos que me esperam pacientemente. Não lhe conheci o nome, nem tão pouco a história de cada vinco até porque entretanto a espetada de vitela e uma fome quase maior do que o calor que me derretia por completo.

O acordeão que trazia devia soar-lhe bem. Pensei em falar-lhe de alguns interpretes que adoro, sugerir-lhe umas quando modas para ele aprender a tocar. Estive até para me levantar, mas a espetada, tão irresistível. Nem sei se teria sido servido, também me esqueci de lhe perguntar. Espero que não me tenha levado a mal, mas da forma como me virou costas e deslizou para a mesa do lado, dá-me a sensação que não iria nunca ser servido, nem tão pouco gostar das modas que tinha para lhe mostrar.

Ainda bem, assim já não me culpo de egoísmo pela moeda em cima da cómoda a servir para coisa nenhuma.
05
Jul07

No lugar da incerteza.

Marco
É estranho este sítio. Fechado dentro de um silêncio ruidoso, onde vozes me puxam com a força de um Hércules enraivecido com a vida. Tenho os braços esticados – será que podiam fazer menos força?, esticados demais, sinto-me em ruptura, vergado ao peso impossível das coisas que têm de ser, porque inevitáveis, postas à minha frente para mim, gritando o meu nome nesse silêncio de que falo, as tais vozes e o Hércules, neste sítio estranho onde estou agora, a meio caminho entre a certeza e a falta dela.

Como diz o meu amigo Filipe, a vida às vezes parece um pião de madeira lançado por uma corda – confesso que nunca soube como fazê-lo, girando sobre si mesmo e podendo cair a qualquer hora... para qualquer lado. Aparentemente tudo certinho, cheio de força, convicto de todas as voltas, sempre disposto a mais uma, e outra, e outra, para depois já nada, caído num qualquer lugar, de certo tão estranho como este agora aqui, parado, à espera que a corda de novo, e de novo certinho, cheio de força, convicto, ainda que noutro sítio.

Preso às palavras que sabia um dia ter de dizer, saboreio este meu último silêncio com o peso de cada letra a remoer-se-me na barriga, dando a sensação de adeus a todos os segundos que passam por mim. Observo o que me rodeia já com a saudade de um fado inesquecível, calo as vozes que me gritam e finto o Hércules, fugindo-lhe escadas acima, onde me espera o peso da inevitabilidade. Gire o pião para onde girar, que a sorte o leve para o melhor dos caminhos e que pedra nenhuma o faça tropeçar antes de tempo.
02
Jul07

Letras de ontem.

Marco
A noite já convicta de si mesma, depois daquela vergonha do sol, que se escondeu sem aviso, dando lugar a um cinzento repulsivo e adeus extenso areal encantado, até um dia. Tinha saudades tuas, sabias? Mas não, nem isso suficiente e por isso adeus, adeus ondas, que se levantaram bem alto, talvez para me cumprimentar, vindo todas, apressadas, ruidosas, entusiasmadas, quase que a correr para mim. Foi bom o reencontro, embora curto de tempo para o tempo de distancia.

E a noite convicta de sim mesma, ainda que antes, um longo derramar de sorrisos, armazenados em meses de rotina e distância. Histórias eternas, episódios clássicos a serem de novo emitidos, resistentes ao sopro fresco da maresia, no fim das horas iluminadas. O passar dos anos disfarça-se como ninguém, é como uma sombra invisível, um agente secreto, que escuta, atento, dissimulado, para depois aparecer, grandioso, impressionante. Estarás tu, ao acaso, por aí, neste momento?

E por fim a noite, convicta de sim mesma, esperando-me de surpresa embrulhada, escondida atrás das suas costas. Sorria, talvez de vergonha, ou então entusiasmo. Não uma, mas afinal duas. Feitas pedaços de escrita irrepreensível, ali, naquele ponto em que o génio se faz explodir, dando origem ao encanto capaz de despertar até um gigante de pedra. Foi já rendido que observei O Rasto dos Cometas, depois da emoção única de ler “O Chapéu”, na Cova do Sono.

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