13
Set06
Mesmo antes de dormir.
Marco
Na calada da noite aqui me encontro. Comigo mesmo. Rodeado de paredes, que estão rodeadas de mundo, que está rodeado de noite, que está rodeada de escuro, que está rodeado de silencio. A lua encolhe-se fingindo crescer. Falsa. Mentirosa. Traiçoeira. Mas bela. Encantadora. Irresistível. Como aquelas mulheres que todos sabemos proibidas, perigosas, mas inevitáveis, irresistíveis. Fatais.Não tarda, os olhos vão fechar-se para um mergulho no sono. Esse mar feito de tempo em suspenso. Em que nada parece acontecer. Por vezes sonhos, ou imagens, ou recordações, ou nada disso, ou isso tudo. O relógio apressa-se e corre veloz até à hora do despertar. Como num jogo de apanhada. E se a meio da noite o olho, ensonado, finge-se de lento. Falso. Mentiroso. Traiçoeiro. Esperando o momento em que o sono me volta a vencer, para correr de novo rumo à manhã de amanhã. Do amanhã.
Jogo de apanhada. De repente, recuei, viajei. Revi-me noutros tempos, em aventuras intermináveis. No tempo do tempo que não passava. No tempo do tempo eterno. No tempo do tempo para tudo. Tanto tempo e agora tão pouco. É melhor acordar, porque pelos vistos já estou a sonhar. Tenho mesmo de acordar porque tenho mesmo de ir dormir. Amanhã é já ali. Acabei de olhar para o relógio. Fingiu-se preguiçoso. Mas eu sei que está só à espera que o sono me vença. E vai mesmo vencer.