Voltar.
E então as pessoas decidiram voltar a apaixonar-se como se essa fosse uma decisão igual a escovar os dentes ou ver se no correio hoje correio, mas mais do que isso, decidiram apostar nessa felicidade que nunca para sempre apesar de sempre para sempre e eu nisto de apenas ficar atento, nisto de molhar apenas o pé em vez de mergulhar a fundo, com medo talvez das ondas, das marés que nos puxam para dentro sem aviso, preferindo a beira mar onde a areia se alisa em vez de um grito desesperado por ajuda até que alguém corra a salvar-me do afogamento mais do que certo.
Ainda assim gabo-lhes a paciência, gabo-lhes acima de tudo a capacidade quase ingénua de acreditar, repetindo as caminhadas do passado na bonita esperança que um novo destino, o tal que se apaga lentamente com o passar dos dias fazendo lembrar os desenhos imperfeitos sumidos por uma borracha que tudo leva e nisto eles caminhando, reconhecendo lugares, lembrando gestos de outros passeios, vivendo de novo aquilo que já uma vez foi, aproveitando esses instantes numa ingenuidade tão forçada quanto enganadora, sempre na secreta esperança que desta vez chegarão ao outro lado.
Se calhar e apenas se calhar nunca se afogaram, se calhar nadam com a calma dos campeões em braçadas calmas, seguras e sabem sempre o momento de voltar a terra, antes das ondas e das marés, onde se enxugam às tuas toalhas deitando-se depois ao sol à espera que a vontade de novo banho apareça para se decidirem, tal como decidem escovar os dentes ou ver se no correio naquele dia correio. Nisto levantam-se alegres, aproximam-se do mar, passam por mim, e não demoram quase nada a mergulhar com toda a convicção deste mundo enquanto eu vou molhando os pés, cheio de dúvidas.